Senhores, hoje estaremos respondendo uma pergunta que poucos de vocês devem ter feito.
- Ora, Luciano. Mas, se eu não me perguntei isso, pra quê eu preciso me responder?
E eu respondo: Pra você entender o próximo texto. Mas também pra você se tornar diferenciado na sua profissão e realmente compreender que os fenômenos calculados na Engenharia Estrutural têm explicação. Não são apenas equações jogadas ao vento.
Essa pergunta “Por quê a flambagem acontece?” é um questionamento muito pouco feito na graduação. Isso se deve ao estudante comum de graduação não se preocupar tanto com a compreensão fenomenológica daquilo que lhe é ensinado por diversos motivos. Mas, principalmente, pela quantidade de matéria sendo-lhe ensinado simultaneamente, etc... Trataremos disso numa publicação futura assim que concluirmos as explicações básicas antes da entrada nas etapas mais “equacionadas” do nosso estudo.
Vamos relembrar a figura 1, original do nosso estudo anterior, que é a figura que mostra um plano isolado de um grão de um sólido cristalino. No texto anterior (O Princípio de Saint-Vernant) aprendemos como ocorre a transmissão desta carga.
Figura 1 – Plano de Grão de Sólido
Quase nenhum material no planeta possui cristais perfeitos. Os processos de fabricação acumulam possibilidades de penetração de impurezas nos materiais de construção civil. Além de que são acrescentados outros componentes que podem ser considerados como impurezas estratégicas (essa estratégia será explicada no próximo texto) por hora, vou apresentar-lhes dois dos vários defeitos causados nos grãos do material causados pelo processo de fabricação: Lacunas (também chamadas de vacâncias) e Interstícios.
As lacunas aparecem, por exemplo, pelo resfriamento rápido de um material. É o que acontece com os vidros temperados. Os grãos se formam durante o processo de solidificação dos materiais, como foi dito anteriormente, ou pela formação sob pressão. Em ambos os casos, a velocidade do processo é muito importante para a perfeita formação dos grãos e células unitárias. Quando isso ocorre, acontecem as vacâncias, que é a falta de um átomo na formação do grão. Isso pode acarretar em uma simples ausência na malha, o que não desorganiza o material, como mostra a figura 2a, ou gerando aproximação de outros átomos e gerando uma desordem na malha geral como mostra a figura 2b.
a) b)
Figura 2 – vacância sem mobilização de átomos (a) e com mobilização de átomos (b)
Para ambos os casos, ocorre um desbalanceamento da transmissão das cargas no entorno do defeito cristalino. Tal que esse desbalanceamento para o primeiro caso (figura 3a) mantêm uma distribuição mais compreensível enquanto o segundo caso (Figura 3b) ocorre um desbalanceamento inicialmente idêntico ao primeiro caso, no entanto, seguido por uma desordem no sistema no entorno do defeito cristalino.
a) b)
Figura 3 – Caminho das cargas no sistema cristalino com defeito de vacância
Assim, A transmissão das cargas, resumindo-as a cargas concentradas que acumulem os valores das cargas transmitidas átomo-por-átomo, é mostrada na figura 4. Observe que ocorre um desbalanceamento lateral das cargas ficando, o sólido, comprimido de forma não centrada (como era a entrada inicial da carga como mostra a figura 3), e também temos uma carga horizontal residual, já que uma das cargas inclinadas mostradas na figura 4 é de valor maior que a outra enquanto ambas seguem o mesmo ângulo (ou muito próximo).
Figura 4 – Desbalanceamento das cargas em estrutura cristalina com defeito de vacância
Para os defeitos intersticiais, o que ocorre é que um átomo (maior ou menor do que o átomo do material), também chamado de impureza, ocupa um espaço que não lhe é natural no grão. Na impossibilidade de sua expulsão por algum processo energético na formação do material ou por questões de aprisionamento devido às pressões do próprio material durante sua solidificação, ele se aloja em um grão e, assim, gera desordem nos planos da rede cristalográfica como mostra a Figura 5.
Figura 5 – Caminho das forças em estrutura cristalina com defeito intersticial
Como é perceptível, a distribuição dos carregamentos descentraliza-se e, acumula-se no átomo maior. Isso porque ele possui ligações com mais átomos do que os átomos do próprio material. Assim sendo, ele possui mais força de ligação e é necessário muito mais força externa para deslocá-lo de sua posição inicial. Com isso, sendo mais rígido (quando tratarmos sobre Método dos Deslocamentos, ficará claro que “Quanto mais rígido, mais força é mobilizada para este corpo”), ele desvia o centro de forças e, aparece uma carga horizontal residual não-combatida como mostra a figura 6. Observem que além do carregamento desbalanceado, também há átomos que não eram carregados na Figura 6 do texto “O Princípio de Saint-Vernant”.
Figura 6 - Desbalanceamento das cargas em estrutura cristalina com defeito de vacância
Expandindo o conceito, se todos os planos de grãos que contiverem defeitos terão suas cargas desbalanceadas, então os grãos também serão desbalanceados. Sendo o material cristalino feito de uma quantidade certa de grãos, Então, todos estando desbalanceados, o material em si estará com cargas desbalanceadas. Logo, a peça estrutural terá micro-desvios em suas tensões, carregamentos horizontais desbalanceados e compressões são totalmente centradas como as figuras 8 e 9 do texto sobre o Princípio de Saint-Vernant. Portanto, para o pilar da figura 7, sob carga centrada, o mesmo é verídico.
Figura 7 – Pilar exemplo
Espera-se que este pilar esteja sob tensões totalmente distribuídas e centradas como mostrava a figura 11 do texto sobre Tensões e Deformações. Também se espera que o mesmo pilar sofra deslocamentos apenas em seu comprimento, perdendo altura (encurtando-se). Para pequenos carregamentos ou a depender de suas dimensões e outros fatores, talvez isso ocorra. No entanto, em 1757, Euller estudou colunas e analisou que a partir de uma certa carga (posteriormente chamada de “Carga Crítica de Flambagem”), ocorre um fenômeno causado pela perda do comportamento esperado (Citado no começo deste parágrafo). Euller verificou que as barras começavam a se curvar ao invés de apenas deformarem-se longitudinalmente, como era de se esperar, como mostra a figura 8.
Figura 8 – Pilar Exemplo Deformado sob carga crítica
Esse fenômeno ocorre exatamente porque o material é imperfeito e as cargas não balanceadas (mostradas nas figuras 4 e 6 deste texto) não foram combatidas. Somando-se grão-por-grão, totalizam-se em uma carga horizontal equivalente mostrada na figura 9, curvando o pilar (sem considerarmos a compressão excêntrica causada também pelo desbalanceamento das tensões).
Figura 9 – Carregamento desbalanceado Resultante
Esse carregamento também aparece na outra direção (de maios lado da seção). No entanto, como a viga tem maior resistência à deformação nessa direção, a carga crítica será mais facilmente alcançada na direção com menor resistência à deformação. Esse fenômeno ainda pode ser estudado com aplicações interativas de momento devido à excentricidade da carga que se moveu junto com a extremidade da viga. Mas, isso fica pra um futuro não muito distante.
Nem todos os materiais são de origem cristalina. Como mostra a figura 10, o Concreto e a Madeira não são materiais cristalinos. Mas, o aço é. Então, a flambagem ocorre no concreto devido aos poros causarem o efeito de desbalanceamento de cargas. E a madeira, que é fibrosa, devido às imperfeições próprias das fibras, que possuem direções e curvaturas de crescimento além de defeitos como nós e falhas de corte.
Figura 10 – Pilares feitos com os materiais mais utilizados em estruturas de edifícios
Ainda, a flambagem de pilares muda de forma de apresentação conforme as restrições de cada extremidade, como mostra a figura 11. Portanto, é preciso um novo capítulo que se dedique exclusivamente à flambagem e detalhe o fenômeno para pilares. No entanto isso nos exige estudo de outros conceitos. Não trataremos disso por hora.
Figura 11 – Formas de flambagem de colunas
A compreensão do fenômeno de flambagem nos permitirá sua aplicação futura no dimensionamento de elementos estruturais (obtenção da carga limite) sempre que o mesmo sofrer compressão. Barras de treliça, colunas, escoras e outros elementos comprimidos. Há de se frisar que a flambagem é um efeito causado pelas cargas de compressão. A tração tende a retificar as peças (imagine uma corda sendo esticada. Ela fica mais reta quanto mais carga aplicar).
Conceituando então, a flambagem é um fenômeno sofrido pelas peças estruturais devido ao desbalanceamento das tensões de compressão causados pelas imperfeições dos materiais com os quais são fabricados os sólidos.