Fissura, trinca, rachadura ou fenda? Talvez uma das grandes dúvidas que pairam sobre os engenheiros(as) diagnósticos. Então, deixa eu te ajudar a esclarecer.
O uso de diferentes termos para aberturas é comumente utilizado em laudos e em literaturas de engenharia diagnóstica. Mas será que existe alguma recomendação normativa para o uso de diferentes terminologias? Será que isso é realmente importe para a redação de um laudo?
Bem, antes de tudo, esses termos são utilizados para definir amplitudes de aberturas. A medida que encontra-se aberturas com determinada magnitude, é utilizado termos para definição, como, fissura, trinca, rachadura, fenda e recentemente encontrei um novo termo chamado brecha.
É importante entendermos que não há uma definição unânime em livros e artigos relevantes, sobre as nomenclaturas e nem mesmo de suas amplitudes. É comum encontrar as duas classificações abaixo:
Abertura |
Classificação 1 |
Classificação 2 |
Fissura |
até 0,5 mm |
até 0,5 mm |
Trinca |
0,5mm a 1,0mm |
0,5 m a 1,5mm |
Rachadura |
1,0mm a 1,5mm |
1,5 mm a 5,0 mm |
Fenda |
acima de 1,5 mm |
5,0 mm a 10,0 mm |
Brecha |
|
acima de 10,0 mm |
O IBAPE-MG e o IBAPE-SP são algumas instituição que definem diferentes nomenclaturas para amplitude diferentes. Mas nem mesmos os dois IBAPE entram em concenso, já que o IBAPE mineiro define cinco nomenclaturas, fissura (até 0,5mm), trinca (entre 0,5mm e 1,0mm), rachadura (entre 1,0mm e 5,0mm), fenda (entre 5,0mm e 10mm) e brencha (acima 10,0). Já o IBAPE paulista define apenas três nomenclaturas, fissura (até 0,5mm) trinca (entre 0,5mm e 1,0mm) e rachadura (acima 1,0mm).
As classificações das aberturas em diferentes nomenclaturas é uma forma de apresentar a amplitude de determinada abertura. Mas essa classificação não define o grau de risco desta manifestação patológica.
Jamais busque classificar o risco das aberturas de acordo com sua amplitude. É necessário diagnosticar a origem e monitorar a sua atividade
É possível encontrar alguns materiais na internet que tendem a definir que as rachaduras são mais perigosas do que as fissuras. Isso não é prudente!
Vamos imaginar que devido a um recalque diferencial (afundamento das fundações) as alvenarias apresentaram uma abertura de 2,0 mm. Mas esta já se encontra estabilizada a anos. E na mesma casa existem aberturas de 0,5 mm, em progressão, ao longo da viga de concreto armado.
Certamente as ditas “fissuras” apresentam maior risco do que as ditas “fendas” ou “rachaduras”. Então, não cometa esse equívoco.
Mas o que as normas brasileiras falam sobre isso?
Bem, essa é a hora de colocarmos os pontos nos ÍS. Pois as normas são as diretrizes da engenharia e da arquitetura. Livros e artigos são excelentes materiais para orientar e difundir conhecimento prática e teórico, mas não podem contradizer as normas e nem impor conceitos inexistentes.
Claro que as doutrinas (nova forma de pensamento ou interpretação descrita em uma literatura) são frutos de pesquisa e alimentam as revisões das normas, mas devemos entender que tudo que não está redigido em normas, não é obrigatório.
Dito isso, esclareço que a ABNT não esclarece diferenças entre os termos, inclusive os termos rachadura, fenda e brecha, não passam nem perto de qualquer publicação das NBR.
A verdade é que temos dois momentos chaves dentro das publicações que alimentam essa discussão entre os diferentes termos.
Em 2003, na publicação da ABNT NBR 9575 – impermeabilização e Projeto, a norma define fissura com aberturas de até 0,5mm, e trincas como sendo aberturas de até 1mm.
3.46 fissura: Abertura ocasionada por ruptura de um material ou componente, inferior ou igual a 0,5 mm.
3.75 trinca: Abertura ocasionada por ruptura de um material ou componente superior a 0,5 mm e inferior a 1 mm.
(ABNT,2003)
O corre que a própria norma deixou uma “brecha”, pois se trinca é até 1mm, o quer seria as aberturas maiores que 1mm?
Pois bem, deu-se início ao uso dos demais termos para classificar aberturas maiores do que 1,0 mm. E como não existe orientação da norma, as classificações como rachadura, fenda e brecha, foram criadas e cada autor definiu a amplitude que bem entendeu.
O segundo capítulo desta história ocorreu em 2010, com revisão da ABNT NBR 9575 – impermeabilização e Projeto, que simplesmente acabou que essa definição. A norma alterou o conceito de fissuras e na definição de trinca refere-se diretamente ao item de fissura.
3.37 fissura no substrato: abertura ocasionada por deformações ou deslocamentos do substrato, que pode ser classificada em estática ou dinâmica- cíclica, finita ou infinita – e cuja amplitude é variável (a seleção do tipo de impermeabilização deve prever a amplitude de abertura e classificação da fissura)
3.56 trinca: ver fissura, 3.37 (ABNT,2010)
Neste momento acabou-se qualquer definição sobre diferentes nomenclaturas para aberturas, mas essa história tem um novo capítulo em 2017 com a revisão da ABNT NBR 13755 - Revestimentos cerâmicos e paredes externas com utilização de argamassa de fachadas colante. A norma não esclarece o limite de amplitude para fissura, mas define que trinca são fissuras iguais ou maiores que 0,6mm. E agora temos um novo impasse.
3.17 fissura seccionamento na superfície ou em toda a seção transversal de um componente, com abertura capilar, provocado por tensões normais ou tangenciais. As fissuras podem ser classificadas como ativas (variação da abertura em função de movimentações higrotérmicas ou outras) ou passivas (abertura constante)
3.40 trinca expressão coloquial qualitativa aplicável a fissuras com abertura maior ou igual a 0,6 mm
Então, para a publicação mais recente da NBR 13755, todas as fissuras iguais ou maiores do que 0,6 mm podem ser definidas como trincas.
Mas ressalvo que a norma estabelece que o termo trinca é apenas uma expressão coloquial (popular ou informal) utilizada para se referir a fissuras que sejam maiores do que 0,59 mm. Assim, entendo que a norma não exclui a utilização do termo convencional, fissura, para aberturas de grandes amplitudes, mas apenas define um “codinome” que expressa a mesma definição.
Mas qual é a conclusão? Usar ou não usar os diferentes termos?
De forma objetiva, não há nenhuma razão para usar, e nem para não usar diferentes termos. A verdade é que a norma não cita os nomes rachadura, fenda ou brecha, e nem define com clareza o conceito de fissura e trinca.
Então, entendo que é algo estritamente da escolha do perito. Caso o engenheiro ou arquiteto entenda que seja necessário a diferenciação dos termos devido a amplitude, fica a seu critério utilizar essas terminologias. Porém, caso não veja a necessidade e opte por denominar todas as aberturas de fissura, trinca ou rachadura, não há problema.
Caso o perito escolha diferenciar os termos, deve deixar a diferença bastante clara logo no começo do laudo, para que o destinatário do documento não fique confuso com as diversas nomenclaturas.
No meu entender, acredito que o uso de uma nomenclatura é a melhor opção. Pois o objetivo da redação é produzir um laudo que seja facilmente compreendido, e por isso entendo que o uso de um termo é menos confuso. É mais simples explicar que existem fissuras de 0.1mm, 1.2 mm e 4.0 mm, do que explicar que existe uma fissura, uma rachadura e uma fenda e que esses termos estão conceituados no começo do laudo. Devemos facilitar o entendimento.
Mas essa é a minha humilde opinião. O meu objetivo deste artigo foi apresentar as definições das normas e das literaturas, ficando a critério do perito a escolha do termo que melhor se adeque.
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