Sejam bem vindos a este blog voltado para o ensino de Estruturas. A função deste canal basicamente é apresentar as nuances dos sistemas estruturais de concreto armado partindo do fim da Mecânica das Estruturas, já observando detalhes estruturais desse sistema em particular. É imprescindível, então, que já tenhamos conhecimento sobre os materiais de construção e as características físicas dos mesmos, de onde partiremos, então para as considerações normativas dos mesmos. Antes, nesse texto, gostaria de dedicar este texto a falar sobre a profissão de Engenheiro Estrutural. Mas especificamente sobre o que disse o Engenheiro Civil e Professor Péricles Brasiliense Fusco:
“muito se fala sobre como ensinar, mas pouco sobre como aprender”.
Frente às considerações normativas, os materiais são considerados imperfeitos, como o são, realmente. Portanto, não confiamos em seus valores de resistência e aplicamos minorações convenientes que visem cobrir a falta de confiabilidade. Existem também incertezas dos efeitos do tempo nos materiais das estruturas e imprecisão quanto aos aparelhos de aferição. As incertezas acumuladas aumentam a insegurança quanto a relação dos valores obtidos em laboratório e dos valores reais alcançados em obra.
A NBR 6118 (ABNT, 2014) orienta que o concreto tenha sua resistência minorada em 1,4 e o aço em 1,15. A diferença dos valores de minoração se explicam pelo próprio processo de usinagem dos materiais. Enquanto o aço possui rigoroso processo de fabricação com controle de pureza dos materiais, temperatura de fabricação tecnologicamente aferida e controlada, forma, peso específico e dosagem garantidas a níveis moleculares por profissionais altamente capacitados e assistidos; o concreto é produzido com a areia que mal sabemos de onde veio ou do que é composta sem controlar realmente sua granulometria e composição ou pureza, adicionamos agregados graúdos sem os mesmos controles e ainda sem garantir que não estaremos adicionando mais finos alterando a taxa de argamassa, ambos com armazenamento deveras mal controlado e aglomeramos com cimento muitas vezes mal armazenado hidratando-o com uma quantidade de água muito empiricamente adicionada, muitas vezes sem abater a água já presente nos agregados, armazenada em uma caixa d’água ao lado do local de usinagem já cheia de impurezas, tudo misturado em um equipamento por tempo avaliado visualmente através da consistência aparente, sem controle de rotações e forma, mal limpa e geralmente com furos que permitem a perda da água de emassamento assistido por profissional, não raramente, analfabeto.
Costumo dizer que o Engenheiro Civil que trabalha com concreto armado precisa lembrar que trabalha com tudo de ruim e de pior que existe no mundo. Usamos materiais de origem duvidosa, com propriedades mal controladas, mal armazenados e extremamente impuros. Nossa mão-de-obra é a menos capacitada, muitas vezes com aprendizado artesanal (conhecimento passado através das gerações, sem estudo científico da técnica e sem treinamento direcionado. Tudo feito através da experiência), provavelmente analfabetos e recebendo salários pífios. Nosso maquinário de trabalho é mal tratado, pouco assertivo e quase nunca aferido. Nosso ambiente de trabalho é inóspito, algumas vezes insalubre e ficamos expostos a riscos enormes.
Quanto aos projetos, basta que seja citada a célebre frase do Engenheiro britânico Eric J. Brown:
“a arte de moldar materiais que não compreendemos realmente em formas que não podemos analisar realmente, para que resistam a forças que não podemos avaliar realmente, de maneira que o público não saiba disso realmente”.
A quantidade de incertezas envolvidas no projeto deixa bem claro que projetar estruturas não é sobre acertar, mas sobre manter os erros e incertezas sob controle. Um amigo, ex-estagiário, ex-aluno e atualmente colega de profissão, o Engenheiro Civil Caio Antonio Costa diz que
“O Engenheiro Civil mede com uma trena, risca com um giz e corta com um machado”.
Complemento citando o que disse o Estatístico George Box:
“Todos os modelos estão errados, mas alguns são úteis”.
Os modelos de cálculo que serão apresentados, todos buscam descrever o funcionamento das estruturas, seus materiais e seu trabalho conjunto e isolado de forma aproximada, a favor da segurança. Mas nem sempre é viável a aplicação desses modelos, ou até mesmo desnecessários quando podemos solucionar o problema com métodos mais simplificados e consagrados.
Por isso, termino com uma frase do Engenheiro Robert L. Norton:
“É preferível obter uma resposta aproximada razoável, mas rápida, que indique se o projeto funciona ou não, do que gastar mais tempo obtendo o mesmo resultado com casas decimais”.
De onde deixo minha crítica quanto a quem profere frases que indicam a inutilidade de métodos consagrados colocando os novos métodos como únicas verdades ou valorizando-os além do verdadeiro valor.
Ao mesmo tempo, passando da fase de compreender as incertezas embutidas nas nossas atividades profissionais, há de se falar da insegurança. Poderíamos simplesmente criticar as universidades, professores e empresas. Mas, principalmente, focarei em autocriticas. Começo citando um colega de profissão que tive o prazer de compartilhar salas de aula como alunos de graduação e mestrado, o Engenheiro Civil Leonardo Calheiros que, em uma entrevista, na comemoração de 10 anos do curso na faculdade onde graduamos, feita por um professor onde o Engenheiro Leonardo foi questionado sobre “o que ele diria que foi a maior dificuldade durante o curso quando ainda era graduando?”, o mesmo proferiu a seguinte resposta, que tomo a liberdade de ir comentando aos poucos entre chaves:
“Eu poderia dizer que foram os professor [que nós julgávamos desinteressados ou mal preparados], ou a falta de infraestrutura [que era precária faltando laboratórios, salas de aula mal preparadas, laboratório de informática já obsoleto...], ou a biblioteca [faltavam livros e os que tinham, eram em quantidade insuficiente], mas, sendo bem sincero, foi a minha preguiça”.
Em conversa com o mesmo, concordamos que estudamos muito mais depois de graduados. Éramos extremamente imaturos e não compreendíamos bem as coisas. Nos faltava dedicação, atenção, vontade e humildade. Hoje estudamos sozinhos, aprendemos sozinhos e desenvolvemos nosso próprio conhecimento sem a infraestrutura da faculdade, sem os professores... Só com os livros.
Portanto, é fundamental o estudo na engenharia estrutural. Muitos softwares tem surgido e prosperado na Engenharia Estrutural. Os alunos começaram a questionar-se da importância real da teoria e do conhecimento analítico sobre as estruturas já que “os softwares fazem tudo”. O Engenheiro e Professor Dr. Avelino Alves Filho do NCE profere uma frase brilhante:
“Se o engenheiro não sabe modelar o problema sem ter o computador, ele não deve fazê-lo tendo o computador”.
Sem saber como o computador analisa, você não é capaz de avaliar a resposta que ele entrega, resolver da forma correta os problemas de análise e dimensionamento, fazendo assim com que seu projeto tenha problemas e erros conceituais embutidos. Quem projeta estruturas há alguns anos percebe a necessidade do conhecimento teórico para sair de saias justas em seus projetos. Além de que quanto mais você projeta e mais o tempo passa, mais casos complexos aparecerão, mais teoria é necessária para aplicar novas tecnologias nos projetos, novas técnicas e novos sistemas. O Professor Edward Wilson, um dos pioneiros no MEF e um dos programadores do SAP 2000 diz que:
“Um engenheiro estrutural experiente e capaz faz sobre a perna, nas costas de um envelope, o que um jovem inexperiente jamais fará com toneladas de computadores”.
Adianto que, para compreender os tópicos desse novo blog, então, é necessário estudar. Mas, vejam que este texto se baseia muito mais no que observei em obras, concreteiras, escritórios e no que li e vivi do que sobre o que estudei. Então, também é necessário, além de estudar, observar a cidade que vive, o mercado em que estás inserido, a universidade em que estudas, os colegas que lhe cercam e o que dizem os mais experientes e os consagrados profissionais. Uma coisa é ficar idoso, outra coisa é ficar velho.
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